quinta-feira, 1 de março de 2012

Jejum Quaresmal

* Por Adilson Silva
Como é sabido de todos, a nossa Igreja Católica orienta que se faça jejum, ao menos, duas vezes ao ano, a saber: na Quarta-feira de Cinzas e na Sexta-feira Santa. No entanto, também, sabemos que o jejum é considerado, por muitos, hoje, como algo antiquado, fora de moda, ou mesmo sem sentido. Afinal, quem exerce a prática do jejum atualmente? Muitos argumentos são construídos para se dizer que o jejum é algo obsoleto e descartável, portanto, mais do que nunca, faz-se necessário aprofundarmos o sentido do jejum e a sua importância para vivermos, santamente, esse Tempo Quaresmal.

Um primeiro aspecto que podemos mencionar, aqui, é o fato de que jejuar não consiste na mera abstinência de alimento; se fosse assim, as modelos bulímicas e anoréxicas [aquelas jovens magérrimas que não se alimentam para não engordar e, quando comem alguma coisa, sentem remorso e vomitam para não ganhar calorias] seriam todas consideradas santas pela Igreja. Apenas passar fome não santifica ninguém, pelo contrário, pode até matar. Não se trata apenas de abster-se da comida, para que o jejum seja válido, é necessário que se tenha uma intencionalidade espiritual. Justamente! É o meu desejo, a minha intensão que dá sentido à minha prática de jejum, a fim de se obter a graça almejada.

Bom, se o jejum não é o simples ato de ficar com fome, o que é afinal? Vejamos, podemos dizer que o jejum consiste na prática da abstenção de uma das principais refeições do dia, a fim de se obter um autocontrole dos desejos e do apetite. Sendo assim, é uma ascese, exercício espiritual para se alcançar a virtude da Temperança, ou seja, o autodomínio. Precisamos ter o controle dos nossos desejos e dos nossos instintos, pois se não os dominamos, eles nos dominam. Alguém pode perguntar: como assim? Então, o jejum é uma atitude espiritual que nos ajuda a por limites ao nosso corpo. Por exemplo, uma pessoa que tem compulsão por comida, não consegue se controlar na hora da alimentação [a famosa gulosa], deve ser orientada a exercitar a prática do jejum. Este vai conceder-lhe a Temperança, o autodomínio, a fim de poder utilizar-se dos alimentos de forma saudável e não de forma prejudicial.

Mas se eu não tenho problema com a gula, por que devo fazer jejum? Alguém pode pensar. Mesmo quem não tem problema com a gula, em algum momento, já cometeu este pecado; quem nunca exagerou no momento da refeição, sobretudo, quando é aquela comida que mais gostamos? Quem nunca, após uma bela refeição, sentiu ter passado do limite? Neste caso, uma boa penitência para essa Quaresma é se alimentar e não ficar saciada. Isto mesmo. É bom levantar-se da mesa sempre com um pouco de fome, esta é uma ótima forma de educar o nosso apetite e o nosso corpo. Assim, aos poucos, vamos educando nossos desejos, pois nem tudo aquilo que desejamos, podemos fazê-lo.
Depois, o jejum não serve apenas para combater o pecado da gula, mas é uma forma de nos fortalecer na luta contra todos os tipos de pecado. Todos nós temos desequilíbrio com alguma coisa: alguns com a comida, outros não controlam a língua [este é um mal terrível], outras pessoas não controlam o dinheiro, outras, ainda, possuem compulsão em comprar roupas e coisas desnecessárias e assim por diante. Deste modo, o jejum pode ajudar a pessoa a equilibrar todos os seus impulsos desordenados. Pois quem, aos poucos, vai educando seu corpo, impondo-lhe limites, renunciando a pequenas coisas, será capaz de renunciar à grandes coisas quando for preciso. Quem não é fiel no pouco, não será fiel no muito.

É importante enfatizar o fato de que é necessário ter a intensão de jejuar para que este seja válido. Sendo assim, não vale ideia de quem passa da hora de comer, por qualquer motivo, e depois diz que está jejuando. Ou, então, fazer como uma jovem que possui o habito de, diariamente, não fazer a refeição matinal, porque não tem apetite, e quando chega a Quaresma diz que esse é seu jejum, não se alimentar pela manhã. Aqui não há renuncia. O jejum significa abrir mão de alguma coisa. Como, também, não se deve começar o jejum de alimento e se distrair com coisas supérfluas, sem buscar santificar seu dia com práticas de oração e de caridade. Através do jejum busca-se a comunhão com Deus, a mortificação dos desejos desregrados e a liberdade de espírito para melhor realizar a vontade do Senhor em nossas vidas.
Caros irmãos e irmãs, diferente daquilo que muitos podem pensar, não é por acaso que a Igreja propõe o jejum na Quaresma, este foi um caminho de santificação de muitos santos e santas de Deus. Grandes santos, na história da Igreja, alcançaram o ápice da vida cristã através do exercício do jejum, da penitência e da oração. Dentre eles, podemos citar São João Maria Vianney, o cura d’Ars, santo padroeiro de todos os párocos do mundo, que viveu, com radicalidade, as virtudes cristãs, submetendo-se a fortes penitências, jejuns e oração. Assim, tornou-se conhecido por ser um santo confessor e através do seu testemunho de doação à sua missão, atraiu multidões ao povoado em Ars, onde vivia, o qual, atualmente, é local de peregrinação e atrai milhões de fiéis todos os anos.
Sendo assim, embora o Código de Direito Canônico nos cânones 1251 e 1253 afirme que: “A quarta-feira de cinzas e a sexta-feira santa, memória da paixão e morte de Cristo são dias de jejum e abstinência”, não significa que se deve jejuar apenas estes dias no ano. O cristão que está buscando uma vida de santidade e perfeição evangélica pode fazê-lo em outras ocasiões que achar conveniente. Por isso irmãos e irmãs, renovemos o nosso ânimo e peçamos ao Espírito Santo de Deus que nos dê a disposição interior necessária para bem vivenciarmos mais uma Quaresma, através do jejum, oração e caridade e, assim, podermos colher os frutos de nossa caminhada espiritual na Páscoa do Senhor. Que assim seja!
*Adilson Silva - seminarista da arquidiocese de Salvador, oriundo de nossa comunidade.

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